mardi 10 juillet 2007


51. O asceta
Havia um jovem yogue que durante anos realizava o difícil processo de busca através do ascetismo. Certa noite ele percebeu assustado que junto a ele, próximo a um lago, havia uma bela jovem banhando-se nua.
Imediatamente todos os anos de renúncia do desejo não lhe valeram de nada. Seu coração foi tomado pela luxúria e ele se apaixonou pela linda jovem. "Ó magnífica criatura, quem és, e o que faz sozinha nessa floresta? Me deixe presenteá-la, me deixe adorá-la, me deixe compreender e provar da sua essência."
"De que te serviria compreender a minha essência? Você não tem se penitenciado durante todos esses anos, não tem passado fome, não tem se torturado de várias formas possíveis para obter a iluminação? De que te servirias me compreender, me provar, me adorar? Você se desviaria do seu caminho." - disse a jovem enquanto lavava a longa cabeleira negra.
"Por favor, ó linda criatura, me deixe conhecê-la" - implorou o asceta.
"Se queres me conhecer, mergulhe nessa lagoa e experimente a minha essência" - finalmente aceitou a jovem mulher.
O asceta mergulhou imediatamente na lagoa e emergiu como Raquel, a virtuosa, filha do reinado do sul.
Em breve, ao atingir seu esplendor em juventude, ela recebeu do pai o casamento com o filho de outro soberano. Ela então experimentou todas as formas do prazer e do amor, teve filhos e quando seu pai morreu, seu marido assumiu o trono. Anos se passaram e a paz parecia ser eterna no reinado.
Mas devido a uma antiga rixa com o principado do norte seu reinado mergulhou numa terrível guerra. O terrível holocausto final havia deixado um rastro de sangue onde todos os seus amigos, todos os seus parentes, seus filhos e marido, haviam morrido.
Raquel reuniu seus filhos e seu marido numa pira funerária e ateou fogo. Ao ver o crepitar das chamas gritou "Meus filhos, meu marido, todos mortos, para que a minha vida há de servir a partir de agora?" atirando-se nas chamas. Nesse momento Raquel viu-se emergindo das águas do lago como o asceta solitário.
A jovem, que havia acabado de banhar-se esperava-o nas margens enxugando seu belo corpo nu. "Quem é o filho cuja a morte lamenta? Quem é o marido a que chora?" O asceta tomado de confusão e vergonha prostrou-se diante da jovem.
"Essa é a imagem de minha essência. Você provou os meus deleites, adorou minhas belezas, e também sentiu uma de minhas fragrâncias nos corpos mortos e queimados que viu. Nenhum deus pode compreender as minhas profundezas ou conhecer o meu verdadeiro significado."
O asceta prostrado diante da jovem suplicou "Mostre-me mais sobre a sua essência, permita-me que eu aprenda um pouco mais sobre Ti."
"Traga-me um pouco de água para matar minha sede, depois continuaremos a conversar."
O yogue saiu apressadamente rumo ao povoado que havia próximo a floresta para tentar arranjar água para a jovem. Chegando lá bateu na primeira casa que viu pela frente. Veio abrir a porta uma adolescente de beleza incomparável e ele sentiu em seu peito algo que jamais havia sonhado.
"Meu nome é Esther - recebeu a bela adolescente o estranho que batia a sua porta - de onde o senhor vem, está cansado, quer entrar e descansar em minha humilde moradia?"
Meio bêbado de emoção o asceta aceitou o convite e foi recebido alegremente por todos os parentes da adolescente. Esquecendo-se de sua missão o homem permaneceu no povoado em companhia daquelas pessoas maravilhosas. Passado um certo tempo solicitou ao pai da moça a sua mão em casamento. Fato que não foi surpresa para ninguém pois todos já haviam percebido o amor que havia entre ambos.
Casou-se com a moça e veio a ter uma família grande, com três filhos, e a trabalhar na terra, como um lavrador. Depois de onze anos havia se tornado um próspero e adorado comerciante. No décimo segundo ano a estação das chuvas foi extraordinariamente violenta: inundações, alagamentos, colheitas perdidas, e todo o povoado viu-se prestes a padecer submerso frente à eminente inundação.
O ex-asceta juntou sua família e pôs-se a fugir carregando o que podia. Uma mão amparando a esposa, levando na outra dois dos filhos maiores e conduzindo o terceiro sobre os ombros. Ia ás pressas em meio a chuva e a escuridão. Tentava-se equilibrar na lama escorregadia mas a chuva aumentava e ele começava a perder suas forças. Seus filhos choravam, sua mulher gritava, um vento aterrorizante parecia que iria levar a todos.
Tropeçando numa pedra caiu no chão e o filho menor foi-se levado pelas águas. Desesperado soltou-se dos filhos crescidos para tentar agarrá-lo mas já era tarde demais. Ao olhar para trás viu os outros dois afogando-se na violenta correnteza. Não via mais a sua adorada esposa. Desejando morrer deixou-se ser levado pela correnteza e foi jogado inconsciente numa margem em cima de uma rocha. Ao acordar e ver a água lamacenta que tudo cobria, chorou.
"Onde está a água que te pedi?" - disse a jovem enquanto enxugava o belo corpo.
O asceta voltou-se e percebeu sentado junto a bela jovem na beira do rio com um maravilhoso sol os iluminando. Ainda confuso, tentava entender tudo o que havia passado.
"Compreende agora o segredo de minha essência?" - perguntou a jovem.