dimanche 8 juillet 2007


5. Corpos

No que se refere a leitura sobre a sexualidade da mulher e do homem ocidental possuímos basicamente duas perspectivas, duas leituras de mundo: uma, a partir do modelo psicanalítico/filosófico, onde se constrói um modelo em função do conceito de pulsão, e a outra, a partir do modelo comportamentalista/mecanicista, onde se explica a sexualidade como uma espécie de gatilho biológico para propagação da espécie. Deixando de lado, é claro, a visão do assunto através da ótica dos fundamentalistas dos Livros.

O Tantra por sua vez tem uma leitura bastante diferente da questão: “...a Mãe Divina – disse Ramakrisna – revelou-me no templo de Kali que era ela que tinha se tornado todas as coisas. Ela mostrou-me que tudo estava em plena Consciência. A imagem era Consciência, o altar, as vasilhas de água do altar, o umbral da porta, o piso de mármore, tudo era Consciência. Encontrei tudo na sala embebido de pura beatitude. Vi um homem perverso em frente ao templo de Kali, mas também nele vi o poder da Mãe Divina vibrar. Foi por isso que alimentei um gato com o alimento que seria oferecido à Mãe Divina.”

Tudo é Consciência. E a nossa sexualidade pode ser um veículo poderoso para se perceber essa Consciência. E diferentemente de outras escolas iniciaticas, o Tantra não trabalha com exclusão: TODOS os aspectos do ser e da existência podem ser utilizados para a realização espiritual.

John Powers, por exemplo, nos diz em seu livro Introduction to Tibetan Buddhism - Snow Lion Publications, que o Tantra propõe incorporar todas as ações, todos os pensamentos, todas as emoções, no caminho. "Nada em si é puro ou impuro, bom ou ruim, mundano ou transcendente; as coisas só aparecem para nós destes modos por causa das idéias pré-concebidas." - ele afirma. No sistema do Tantra, qualquer ação — até mesmo andar, comer, defecar ou dormir — pode ser incorporada ao caminho espiritual.

Mas para um vedantino, ou qualquer outro praticante de uma tradição de caráter monoteísta, o isolamento e a transcendência só podem ser obtidos afastando-se das atrações do mundo – consideradas fontes de nossas distrações – e adorando com atenção concentrada o Brahman-Atman sem forma, adorando Deus, adorando Alá; em contrapartida, para o tântrico essa postura se mostra sectária e limitada, pois restringe o todo a apenas uma parte.

E se o Vedanta representa, como afirma Zimmer, a aquisição da herança monista bramânica-ária através da ideologia dos pré-arianos, que procuravam a integração e o isolamento, é possível dizer então que no Tantra estamos diante de uma influência oposta: uma transposição do problema pré-ariano da transusbtanciação psicofísica ao plano da filosofia bramânica não-dualista e afirmativa.

Ou seja, o buscador tântrico não nega determinados caminhos, nem escolhe “trilhas específicas” para isso, não busca atalhos para evitar a esfera das paixões – reprimindo-as em seu interior e fechando seus olhos para o mundo, até que, limpo, purificado, possa abrí-los com segurança e observar o samsara com uma retidão imperturbável. No Tantra o buscador encara de frente o seu pior inimigo, não o identificando como tal mas percebendo o vazio de sua existência intrínseca. Onde o ignorante olha o dedo, o sábio contempla a lua - nos ensinam os mestres budistas.